Alimentando a intuição
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Alimentando a intuição

por Vânia Goy

Outro dia despertei com a sensação de que deveria repensar uma decisão de trabalho. Mas relutei. Tinha me comprometido e não achei justo voltar atrás. Tentei encontrar alternativas para não deixar nenhuma parte lesada e me sentir mais confortável. Resumo da ópera: nada me fez sentir melhor, nenhuma decisão parecia tão sábia quanto fazer o que eu acordei com vontade de fazer e, depois de 10 horas sem concentração alguma para fazer qualquer outra coisa, respirei aliviada por ter tomado a decisão que havia mentalizado às 7 da manhã. Na sequência, lamentei não ter seguido a minha intuição logo que despertei. Teria me poupado do desgaste emocional que causei a mim e às pessoas ao meu redor.

Essa coisa de seguir a intuição é algo tão abstrato que a gente duvida quando essa voz pulsa. Muitas vezes confundo esse aviso íntimo com medo ou preocupação excessiva. Mas me lembro de ter ouvido que intuição dá uma sensação de serenidade e paz interior. Medo faz disparar pensamentos catastróficos e ansiosos. Neurocientistas vivem tentando mostrar que há ciência por trás desta sensação e que, sim, ela é real e, aparentemente, pode ser medida. Hoje estava na sala de espera para fazer um exame quando li um texto interessante no Elemental, página do Medium sobre ciência, falando de experimentos que tentaram capturar esse momento. 

Em um deles, publicado em 2016 pela revista Nature, conta que um grupo de cientistas italianos filmou uma série de vídeos com pessoas pegando uma garrafa d’água e decidindo entre colocar o líquido num copo ou beber no gargalo. Eles mostraram o vídeo com um corte e perguntaram aos espectadores o que as pessoas fariam com a água. “Surpreendentemente, suas previsões foram precisas muito acima do nível do mero acaso. Só de ver uma mão alcançar uma garrafa, eles foram capazes de intuir o que aconteceria a seguir”, diz o texto.

Outro experimento reuniu um grupo de jogadores de basquete fazendo lances livres. Jogadores profissionais que assistiram os vídeos conseguiam prever se o arremesso entraria ou não na cesta de forma muito mais precisa do que não-jogadores. Isso dá uma pista do quanto a experiência faz bem na hora de darmos atenção a um insight que chega. “O feedback rápido e preciso é um dos ingredientes essenciais para formar a intuição confiável.”

Cheguei em casa e fui reler um dos contos de “Mulheres que Correm com os Lobos”, livro genial da psicanalista junguiana Clarissa Pinkola que navega por histórias ancestrais para falar com sabedoria sobre o nosso feminino sagrado. Em “A Boneca no Bolso: Vasalisa, a Sabida”, a autora conta uma história tradicional dos países bálticos para dizer que a intuição é o nosso tesouro, o instinto para farejar tudo.

Vasalisa ganha da mãe, em seu leito de morte, uma pequena boneca-talismã com a recomendação que ela pergunte à boneca o que fazer quando precisar de ajuda. Na sequência, cumprindo uma tarefa cheia de percalços, a menina botava a mão no bolso procurando pela boneca a cada bifurcação ou dúvida que aparecia no caminho, questionando o que fazer. Esse relacionamento simboliza o vínculo com a nossa própria natureza intuitiva. Alimentá-la é se ater aos detalhes ao nosso redor, silenciar e, fazer perguntas a si mesma. 

“Não há benção maior que uma mãe possa dar à filha do que uma confiança na veracidade da sua própria intuição. A intuição é transmitida de pai pra filho da forma mais simples. ‘Você tem um bom raciocínio. O que você acha que está por trás disso tudo?’. Em vez de definir a intuição como alguma peculiaridade irracional e censurável, ela é definida como a verdadeira voz da alma. A intuição prevê a direção mais benéfica a seguir. Ela se autopreserva, capta os motivos e intenções subjacentes e opta pelo que irá provocar o mínimo de fragmentação na psique.” 

Que a gente se lembre de sempre conseguir se aquietar, cultivar e dar ouvidos à sabedoria inata.

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