Cabelo
Cabelo esculpido: trançados exuberantes reafirmam orgulho racial e ancestralidade
por Redação Belezinha
foto: Allure
por Julliana Araújo
Na última década, cabelos crespos têm usufruído de mais formas livres e esculturais em penteados exuberantes. Esse novo diálogo com os fios está mais visível com o aumento da representação de profissionais negros na publicidade-entretenimento, mas não só: a área de inovação cosmética e tecnologia capilar também anda mais plural em território nacional.
E, para além do movimento de transição e de assumir os cachos e crespos naturais, encontramos, cada vez mais, versões mais experimentais de penteados protetores. É só olhar as mudanças nas referências visuais de personalidades que alcançam o grande público: Ludmilla, Liniker, Taís Araujo, Ícaro Silva, Iza, Aline Wirley… São só alguns dos nomes que ampliam possibilidades do cabelo crespo na contemporaneidade, incentivando visualidades de contornos e penteados para cabelos não lisos no Brasil, país onde as referências norte-americanas foram tão hegemônicas. “Vejo esse mundo de possibilidades não só quando eu experimento novos trançados, que adoro, mas no tanto que a minha filha também deseja experimentá-los. Outro dia ela pediu duas tranças frontais, coloridas, bem decidida. Coisa que a gente não tinha antes. E, parte do meu papel como mãe, foi mantê-los expostos a referências e cultura negra para que eles entendessem quais outras possibilidades e histórias fazem parte, por exemplo, da escolha estética“, disse Taís Araujo, atriz.
Desgarrar dessa ideia de cabelo simétrico e arredondado acaba dando espaço para novas formas, arranjos singulares e irregulares de pentear, criando desenhos sinuosos e com muito volume nas madeixas — como acontece nas belíssimas inspirações de Nikki Nelms, hairstylist expert no assunto que tem nomes como Solange Knowles, em sua lista de clientes, nos Estados Unidos. Tudo sendo construído com a atualização de produtos como pastas, toucas, escova e secador, antes usados para alisar, agora com objetivo de maximizar e criar formatos nos fios.
E nada disso aconteceria sem a expansão de pesquisa e investimento da indústria para cabelos crespos – essencial para fertilização da representação dessa pluralidade em países com populações afro-descendentes. De acordo com uma pesquisa feita pelo Instituto Beleza Natural em parceria com a Universidade de Brasília (UNB), 70% dos brasileiros possuem cabelos cacheados, e pessoas com cabelos texturizados gastam nove vezes mais produtos capilares que as demais. Seguindo nessa mesma linha, o interesse por cabelos afro aumentou 309% nos últimos dois anos, aponta pesquisa conduzida pelo Google BrandLab em São Paulo. “A internet faz esse leque de exemplos se ampliar e estimula que os consumidores também empurrem as marcas em busca de inovação“, diz Josi Helena, estetacosmetóloga especializada em pessoas negras que lançou, em 2021, uma linha específica de cuidados para o couro-cabeludo de quem faz penteados protetores, a NV Scalp.
Ter um mercado com recursos e ferramentas atualizadas e adaptadas aos cuidados de cabelos texturizados, como também, conectar-se diretamente com a prática de profissionais com essas experiências, possibilita a produção de diferentes materialidades que atendam de forma mais personalizada às necessidades de clientes cheios de desejos. A ideia é que em um futuro breve, a população que frequenta salões premium e consome produtos de luxo tenham identidades plurais, descoladas do que ainda é representado tradicionalmente. “Vejo o tanto que profissionais buscaram se politizar, compreender mais de onde veio essa prática, como cada trança e penteado se relaciona com regiões diferentes da África e é quase um ritual. É bonito ver essa relação entre a técnica e a arte“, disse Wilson Eliodório, cabeleireiro que construiu uma carreira com foco em clientes negras e seus fios naturais.
Empresas e marcas que possuem em seu radar a expertise de não só acompanhar mas, surpreender seu público com fórmulas inovadoras, leves e acessíveis levam vantagem. “ O mercado vem mudando, os materiais melhoraram, as fibras sintéticas estão mais leves, mais flexíveis, com a textura parecida do cabelo“, diz Josi. “Esse empoderamento estético acontece pelo aumento de referências. E a trança como instrumento de reafirmação do orgulho racial ainda vai fazer esse mercado crescer mais nos próximos anos, como vimos acontecer com os portfólios de produtos para os cachos”, finaliza.