Fragrância
Le Labo desembarca no Brasil e, principalmente, o que faz dela uma marca tão cool?
por Vânia Goy
Há pelo menos cinco ou seis anos escuto que a Estée Lauder tem planos de trazer a Le Labo para o Brasil. Finalmente aconteceu e o primeiro espaço da marca acaba de ser inaugurado no shopping Iguatemi, em São Paulo, com a carinha nova-iorquina que a Le Labo tem: móveis vintage, ambiente meio industrial e com ares de laboratório olfativo — que, inclusive, é o significado do nome.
A demora, segundo Daniela Munhoz, diretora de marcas de perfumaria da Estée Lauder, teve a ver, dentre outras coisas, com a experiência de compra da Le Labo e as regras da Anvisa. Aqui, por exemplo, não vai rolar de envasar os frascos vazios com a sua fragrância favorita. Mas etiquetar cada criação com mensagens personalizadas é possível e, a gente sabe, é um dos rituais marca-registrada de comprar na Le Labo.
O portfólio completo está disponível no Brasil: 18 fragrâncias (R$ 2.165, 100ml), perfumes e velas para a casa além de toda a linha de banho, com produtos corporais, faciais e capilares (custando entre R$ 300 e R$ 400) — mais de uma centena de formulações para você se aventurar a conhecer pessoalmente. Alguns deles, inclusive, já esgotados nas primeiras semanas de abertura.
Fãs do Santal 33, não se preocupem, ele está disponível. A fragrância é responsável pela fama de cool da marca: hit entre fashionistas e publicitários do mundo todo, colocou a Le Labo em outro patamar depois de virar o cheiro assinatura de muita gente. Muito sexy, tem uma coisa defumada, um cheiro de couro com especiarias que te faz querer ficar pendurada no pescoço de quem usa. Uma matéria do The New York Times lá nos idos de 2011 brincava que Nova York cheirava Santal 33. Fato é que tamanho sucesso é raríssimo: o próprio co-fundador da Le Labo, Fabrice Penot, concorda. “Temos sorte de ter vários cults em nossa coleção, mas o Santal 33 é mesmo outro nível de sucesso. Como um perfumista, você sempre espera, secretamente, que aconteça, mas não imagina algo com um impacto tão grande. Isso acontece uma vez na vida, se você tem muita, mas muita sorte”, disse ao Fashionista em 2017. O fato é que o Santal 33 é desses divisores de água, marcadores de décadas, como Miss Dior ou Angel, de Thierry Mugler.
A melhor parte é que o hype da marca não se restringe ao Santal 33. Fundada em 2006 por dois amigos cansados do mercado de fragrâncias convencional, a Le Labo tem outros hits deliciosos. No meu top 3 moram o Another 13, um musk animálico, misturado com musgo e jasmim; o Bergamote 22, cítrico, com uma doçura marcante, meio amadeirado; o Ambrette 9, outro musk muito leve, com uma coisinha de fruta, de cítrico, mas quentinho, com cheiro de pele — bom, dá pra entender que tudo é meio misterioso e sexy, né? Segundo Penot, essa é a ideia. “Nós nunca pensamos em termos de gênero na Le Labo. Pensamos mais nas almas — perfumaria tem que ser sexual pra mim, tem que criar algum tipo de atração, de vício.”
Uma das razões para que eu ache as fragrâncias viciantes tem nome: âmbar-gris, minha nota favorita. Já contei aqui que ela é uma espécie de cálculo expelido pelas baleias cachalote e que parece uma pedra. É vomitada pela baleia, fica curtindo no mar e tomando sol até alguém encontrar na praia. E tem um cheiro de almíscar, bem sexy animal, e salgado, marinho, muito limpo, ao mesmo tempo. Bom, Fabrice Penot e Eddie Roschi também são obcecados por este cheiro e não por acaso, tem um tanto dele em muitas fragrâncias da marca — na versão sintética, biên sur.
Outra curiosidade: o número que precedem os nomes — que, por sua vez, indicam a nota principal — revelam a quantidade de ingredientes na formulação. Também não é por acaso que eles são poucos, se comparados a centena que muitos frascos reúnem. Vegana, purista e preocupada com sustentabilidade e rastreabilidade, a dupla de criadores procura efeito máximo com o mínimo de ingredientes.
O rigor com os ingredientes as formulações é, inclusive, uma das razões que faz com que a Le Labo tenha ganhado escala desde a compra de parte da operação pela Estée Lauder, em 2014, sem perder personalidade. “Começamos o Le Labo como uma extensão de quem somos, de como funcionamos no dia a dia. Como marca e como indivíduos, tentamos ser social e ambientalmente responsáveis. Mas nunca nos debruçamos sobre o facto de sermos veganos ou ‘verdes’, porque pensamos que é assim que todos deveriam desenvolver os seus negócios se quiserem estar presentes daqui a 50 anos”, disse Roschi à Global Cosmetic Industry em 2020.
A Le Labo é uma das marcas de nicho expressivas em termos de vendas, mas o investimento em publicidade e marketing é mínimo. E, apesar dos mais de 150 pontos de venda no mundo (coisa pouca perto do mercado de massa, mas bastante pra uma marca de nucho), consegue manter a autonomia criativa. “Ainda somos muito responsáveis pelo desenvolvimento de produtos: não testamos os nossos perfumes externamente e não pedimos uma segunda opinião a terceiros. Acredito firmemente que a criação é uma autocracia, não é uma democracia. Principalmente no caso da perfumaria, não é ideal perguntar às pessoas o que elas acham, porque quando você faz isso você pode ser indevidamente influenciado, seu conceito se dilui e o resultado é um produto de massa”, disse na mesma entrevista.