Skin scents: fragrâncias com “cheiro de pele” estão em alta
Fragrância

Skin scents: fragrâncias com “cheiro de pele” estão em alta

por Redação Belezinha

foto: Alex Batista

por Dênis Pagani

Nos anos 90 a gente alugava dois filmes para ver no fim de semana e passava umas quatro horas vendo TV. Hoje, assistir 8, 10 horas de seriado no mesmo período é comum. De lá para cá vimos a intensidade dos perfumes crescer na mesma medida. Se hoje a gente faz maratona de série, em 30 anos faremos triatlo de televisão? O que vai acontecer com a potência das fragrâncias

Correndo por fora vem a gente vê a chegada das skin scents, uma segunda pele na forma de perfume, construída para valorizar e amplificar o cheiro natural do corpo. Em geral, elas têm projeção mais rente ao corpo, interessadas em conversar com quem veste o perfume e quem está perto. Ame ou odeie os cheiros do corpo, eles estão presentes em todos os perfumes, como explica Tiago Motta, perfumista da casa de fragrâncias japonesa Takasago. “As notas de fundo são o cheiro da pele, são as moléculas mais pesadas, que tem mais aderência com ela. Todas as fragrâncias vão chegar nesse lugar,” ele diz. Tiago se refere às notas de topo, corpo e fundo que compõem os perfumes. As primeiras são as mais voláteis, as últimas, as que restam na roupa depois do uso. As skin scents tendem a ser focadas justamente nelas. 

Pense em toda a variedade da expressão da pele, do cheiro de nenê, leitoso e quase caramelado, da pele quente depois de um dia de praia, do cheiro da dobra do cotovelo duas horas depois do banho, dos cheiros das outras dobras do corpo. Tudo é possibilidade para o perfumista. “Podemos falar das notas almiscaradas, se quisermos falar de conforto e maciez ou até mesmo algumas notas animálicas, que exaltam o cheiro da transpiração, do suor após o sexo,” diz Leandro Petit, perfumista da casa de fragrâncias Givaudan. “Para algo mais comercial uso um pouco de baunilha ou fava tonka, para levar a um universo de fantasia e mais conhecido do público,” conta Tiago. “Às vezes a pessoa não vai nem perceber, estou pensando em quem vai cheirar ela,” complementa.

No lado mais animal da história, me lembro de Muscs Koublai Khan, de Serge Lutens, que arrepia na borrifada com seu cheiro de suor e pelo quente, para depois retrair suas garras e virar puro conforto. A marca Glossier, com seu You, foi na direção do abraço e do conceito, com uma fragrância que veste como aquele moletom que a gente não quer tirar. Ambas estão disponíveis no exterior. Há também versões de marcas de nicho como a Blanche, da Byredo, que se inclina para cheiro de pele limpa e aquecida com um toque de aldeído de sabão, e a Missing Person, da Plhur, que se inspira na saudade que sentimos do ser amado, no cheiro reconfortante da pele com  notas de jasmim, flor de neroli e almíscar cremoso. Já por aqui, gosto de Phebo Bahia, uma fantasia delicada sobre o perfume do coco fresco, com uma textura levíssima, cuja maciez é o ponto alto. E de Amyi 3.17, explorando o carnal do suor pós-sexo de uma forma confortável e gostosa de usar.

Este é um tema recorrente da perfumaria que ganha espaço no exterior nos últimos anos. Vendo os shows lotados de gente, o corpo a corpo nos festivais, e parece que nunca vimos tantos, não consigo deixar de relacionar essa onda com o controle da pandemia. Depois dos períodos de isolamento social, em que o outro representava medo e perigo, a gente quer é mais se relacionar, deixar a pele se comunicar e sentir um cheiro de cangote? Tiago acha paradoxal. “No dia a dia, vejo mais segunda pele no exterior. Quem tem alergia ou não gosta de algo chamativo pode gostar dessas fragrâncias minimalistas. No mercado nacional as pessoas gostam da intensidade do eau de parfum, são fascinadas por fragrâncias que chegam antes e causam impacto.”

Paradoxal parece mesmo definir nossa relação com perfumes. Tomamos banhos demorados, dois ou mais por dia, lavamos o corpo com sabonete perfumado até não restar nada. Então aplicamos perfume para voltar a ter algum cheiro — paradoxo maior se for um cheiro de pele. “Não tenho aversão aos cheiros do corpo, são naturais, nascem espontâneos. É um jeito da sua pele reagir àquela situação, é a linguagem da sua pele,” diz Tiago.

Numa época em que a gente não falava em meme surgiu uma campanha em que alguém, munido de um cartaz, oferecia abraços grátis na rua. Um amigo alemão, que mora em São Paulo há muitos anos, me disse que os brasileiros não precisavam disso — os alemães, sim. A gente se encosta para cumprimentar, abraça e aperta os amigos, a família, para nem falar dos amores. Será que é isso? Nossa necessidade de pele está suprida no convívio, liberando nossa vontade de perfume para voar em outras direções?

“Perfume acaba sendo uma ferramenta de escape, de fuga da realidade que é muito dura. As fragrâncias vão para um universo fantasioso como se fosse um filme. Entendo o gosto do público pelas fragrâncias super doces, orientais, robustas, é também uma forma de acessar um universo diferente,” finaliza Tiago.

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